domingo, 20 de março de 2011

confissões para obama: texto




boa tarde, brasileiros.  sou norte-americano, e queria falar com vocês.  meu presidente obama teve medo de vir para cinelândia e fazer um discurso; ele preferiu se esconder ali dentro do theatro municipal.  como eu não tenho medo do povão brasileiro, vim aqui para fazer um discurso no lugar dele.  enquanto ele fala de cooperação e crescimento econômico e o poder de esperança e seja o que for, eu queria mandar alguns recados pessoais dos estados unidos, e confessar algumas coisas que estavam me perturbando.

olhá só:  nós norte-americanos masturbamos muito.  todos nós, mas principalmente os republicanos, pois eles têm medo de sexo.  os democratas como obama têm medo de tudo.  os democratas como obama têm medo de masturbar, de peidar, de acabar com as guerras que os republicanos começaram, de aparecer em público na america latina, ou de fazer qualquer coisa que poderia ser mal-vista pelos republicanos.

nós norte-americanos temos medo de perder a casa às forcas mercadológicas, ou de perder o bairro com a chegada de gente com pele marrom:  árabes, mexicanos, muçulmanos, latinos, presidentes, terroristas.  temos medo de armas de fogo, e medo de ficar sem armas de fogo.  temos medo de gordura, medo de açúcar, medo dos mamilos em geral e dos mamilos de janet jackson especificamente.

olha só:  aquela história dos livros escolares nos estados unidos marcar a amazônia como território norte-americano não passa de uma lenda urbana. isso porque a maioria dos norte-americanos não sabe onde fica a amazônia, e a maioria que sabe onde fica não se importa, e os que sabem e se importam acham muito mais interessante lucrar com aquilo do que administrar.

confesso que, de vez em quando, sentimos até culpados por bancar tanta destruição na amazônia. mas vocês tem que entender como é bom dirigir um carro enorme para uma churrascaria e comer um filé mignon brasileiro.  a carne de vocês é mais gostosa e muito mais barata.

mas deixa eu te confessar algumas coisas antes de voltar para facebook. 

nós norte-americanos no que passa na america latina, porque estamos ligados no facebook.

nós norte-americanos não estamos ligados no oriente médio porque estamos ligados em nossos iphones.  e porque temos medo de muçulmanos e de árabes, sem conseguir entender a diferença entre essas duas categorias.  nos norte-americanos não estamos ligados no que passa dentro das nossas próprias cidades porque mais que 80% da população tem TV a cabo, e porque temos medo das pessoas que moram nas cidades.

nós norte-americanos temos medo do longo prazo.  nós-norte-americanos temos uma memória muito curta, mais curta que a sua.  temos uma memória mais curta que a sua, e carros e casas muito maiores, e é claro que tudo isso tem uma ligação.

o tamanho dos nossos carros e casas e televisores e ipads e dividas pessoais nos ajuda a não se importar com o que esteja sendo feito no mundo afora ou dentro dos nossos presídios.  isso não se trata de uma característica nacional, e sim de uma função do tamanho dessas coisas.  confesso que enquanto os carros e televisores continuam a crescer no brasil, vejo a mesmo possibilidade aqui.

nós norte-americanos temos medo de burqas e medo de mulheres.  temos medo de idosos.  temos medo de você.  tenho medo das pilhas do megafone acabarem.  tenho medo do petróleo acabar e de eu não poder mais pegar um avião para visitar minha família. na minha última visita aos estados unidos, a companhia aérea cancelou minha passagem, e me colocou na classe executiva no próximo dia. 

tenho medo de nunca mais viajar na classe executiva.  tenho medo de todos os privilégios sumirem.  tenho medo que as estratégias que desenvolvi ao longo da minha vida poderiam começar a não darem mais certo se houver uma verdadeira revolução.  tenho tanto medo das instituições que eu não consigo pensar em como sair delas.

estou viciado no new york times, mas não é porque eu confio nele.  sei que ele está sempre mentindo, mas o tom dele é muito familiar.  eu me sinto em casa, sinto que estou falando com velhos amigos, com pessoas conhecidas que me entendem, que entendem minha vida, que podem até não concordar comigo, mas que me tratam com respeito.

confesso que eu acho obama um enorme covarde.  o bush sempre tomou a primeira decisao que lhe veio a cabeça, ou que foi dada a ele pelo pai, pelo vice, seja como for.  enquanto isso, obama não toma nenhuma decisão sem consultar os democratas, os republicanos, os industrialistas, os grandes empresários, e nenhuma dessas pessoas gosta dele, a maioria por ele ser negro, e ele faz de tudo para agradar los mesmos assim.

sabia que a maioria dos norte-americanos tem medo de palhaço?  é verdade, e é por isso que enquanto vocês elegem tiririca, nos elegemos tirános e covardes.

mas olha só – eu não culpo os estados unidos para tudo que tem de errado no mundo, até porque eu sou de lá.  tô ligado naquela situação, sei como é que é, etc e tal.

mas é o seguinte:  tem que anotar o que está acontecendo, tá ligado?  deixo eu te dar um exemplo:  a reforma ortográfica da língua portuguesa foi uma conspiração norte-americana.

não sabia, não?  olha – dia 1 de janeiro de 2009, a reforma entrou em vigor, e a palavra “ideia” perdeu o acento.  e aí 19 dias depois, dia 20 de janeiro, obama tomou posse.

não entendeu?  a lógica é a mesma porque a métrica é a mesma:  “ideia”.  “obama”.  se não tivesse tirado o acento da primeira palavra, teria que colocar um acento na segunda.  e isso não dá.  não tem acentos na língua inglesa.  aí tiraram o acento da palavra ideia, que tinha ficado lá durante séculos.  tiraram o trema da língua portuguesa.  são essas as conseqüências do império.  alias, as consekencias, já que não tem mais trema.

confesso que eu cresci acreditando na democracia norte-americana.  confesso que acho beisbol muito mais bonito que futebol.

confesso que comprar qualquer coisa sempre me parecia terapêutico.  confesso que sempre torço para os loiros nos filmes de guerra. confesso que não consigo sair de casa de manhã sem comer bacon com ovos mexidos.  confesso que algumas dessas confissões são mentiras.

confesso que a frase “yankees go home” me deixa triste.  confesso que isso é tanto por eu torcer contra o time de beisbol chamado yankees do que qualquer outra coisa.

confesso que já usei meu passaporte para evitar problemas com policiais, aeromoças, garçons e soldados.  confesso que, morando aqui, sinto falta da cerveja e dos sanduíches de lá.

confesso que a filha do bush estudou na mesma faculdade que eu.  confesso que eu pago impostos nos estados unidos que bancam várias guerras.  confesso que, por ter menos grana dos meus pais, pago uma porcentagem mais alta.  confesso que prefiro esquecer disso do que tentar mudar a situação.

tenho medo de dinheiro.  tenho medo de ficar sem dinheiro.  tenho medo de uma nota dessas nunca mais valer uma nota dessas.

tenho medo de ser descoberto.  tenho medo de não ser entendido.  tenho medo de você ter medo de mim.  tenho medo de falar algo banal ou previsível.  tenho medo de falar em português em um lugar público, so i’m switching to english.

when i was in 4th grade, i choked on the soup i was eating for lunch.  i ran out of the classroom and threw up all over the hallway.  that year was the first time the united states attacked iraq, and i stood on the playground with a sign that i’d made that said “no blood for oil.”

i’m afraid that the size of the house i grew up in might determine how effective i can be in making a difference.  i’m afraid that no one can understand what i’m saying, but i’m more afraid of the vídeo running out.  i’m afraid of losing my passport.  i’m afraid of being found out.  i’m afraid of television.  i’m afraid when i stand in line in immigration that they won’t let me in.  i’m afraid of never doing anything courageous.  i’m afraid of never doing anything heroic.

tenho medo de sair de facebook e ser esquecido pelo mundo.  tenho medo de nunca sair de facebook e de me esquecer.  tenho medo de mamilos em geral, e dos meus mamilos especificamente.  tenho medo de falar a coisa errada na língua errada enquanto durmo do lado da pessoa errada.

confesso que eu votei nesse cara que está dentro do teatro municipal.  e confesso que, na hora em que ele foi eleito, senti uma forte esperança.  imaginei que ele poderia fazer várias coisas diferentes.  pensei que, pelo menos, ele ia fechar o campo de concentração em guantanamo. 

confesso que eu sinto tão envergonhado de vir de um pais que mantem campos de concentração que minha vergonha muitas vezes ultrapassa e suprime qualquer consciência as pessoas que estão presas lá. 

confesso que eu votei no obama porque tive medo de uma nova guerra no irã, e agora temos uma nova guerra na líbia.

confesso que eu votei no obama pensando que ele ia ajudar o mundo esquecer do bush.  confesso que, morando no brasil é bom não ter que responder sempre à pergunta “mas você votou em bush” de qualquer novo conhecido brasileiro.  confesso que eu imaginei que um presidente negro automaticamente ajudaria o meu pais a virar um lugar mais justo.

confesso que eu dancei de alegria quando obama foi eleito. confesso que passei alguns dias chorando de alegria.  confesso que eu também fiquei muito feliz quando eu tinha 11 anos e clinton foi eleito.  confesso que eu ainda não sei como votar na eleição do ano que vem.

quarta-feira, 2 de março de 2011

bloco rec!clato!

BLOCO REC!CLATO
sexta-feira, dia 4
22h
praça da cruz vermelha, lapa



Bloco independente, libertário, com proposta de manifestação. Tragam sucatas que façam barulho, e tragam faixas e cartazes ou que você quiser! AS RUAS SÃO SUAS, OCUPE-AS ! Não ao Choque!

http://www.facebook.com/event.php?eid=115568405185055

terça-feira, 1 de março de 2011

carnaval nômade/nomadic carnaval...


queria muito escrever mais sobre carnaval e a rua, mas tenho duas monografias me prendendo no computador.  então, por enquanto, tem isso...

vários amigos – principalmente amigas, e principalmente cariocas – me disseram que já estão de saco cheio com carnaval, que virou controlado e comercializado demais e que nos últimos anos, tem servido basicamente para aumentar e advertir a força do choque de ordem.



estou ligado nos problemas, e vejo o ordenamento e comercialização do carnaval com cada vez mais preocupação (esse carnaval vai ser meu quinto no brasil, então tenho uma certa perspectiva crítica, por mais limitada que seja). mas mesmo assim, fico muito emplogação com carnaval.  pode ser minha gringuice, e do fato de eu vir de um lugar onde nunca se dança na rua.  mas fico encantado pela energia da aglomeração, pelos encontros inesperados que a cidade providencia, e pela possibilidade constante de criar uma nova surrealidade na rua.  sexta-feira, por exemplo, tem bloco recicle na lapa...



ontem, uma amiga me mandou isso. 






acho que poderia ir até mais longe, mas concordo plenamente:  que o carnaval seja espontâneo, imprevisto, e radicalmente brincalhão!






i've wanted to write more about carnaval and the street in the run-up to the craziness (it starts friday), but i've been slaving over two term papers that need to get written before i work out this year's mask-and-glitter combination.  here's a snapshot, though...

several friends – mostly girls, and mostly cariocas (rio natives) – have told me that they’re fed up with carnaval.  they say it’s too controlled and tôo commercial, and that it recent years, it’s mostly served to increase and advertise the strength of the “shock of order” urban reforms.


i’m hip to the problems, and i'm worried about the ever-increasing "order" and commercialization of carnaval (this carnaval will be my fifth, so i have a certain critical perspective, however limited).  still, i get completely worked up for carnaval.  it could stem from my gringo-ness, and the fact that i come from a place where no one ever dances in the street. but i’m enchanted by the energy of the crowds, by the unexpected encounters that the city provides, and by the Constant possibility of creating a new surreality on the street.  this friday, for example, there will be a recycled instruments procession in lapa...

yesterday, a friend sent me this (in portuguese):

it's the "nomadic carnaval" manifesto, which proposes, among other things, spreading blocos (street processions) more evenly throughout the city; breaking off from major blocos to start improvised ones; knowing when to break with tradition to start something new; "trading" neighborhoods, so that different crowds get to know different blocos; and, most importantly, refusing to register with city hall, which essentially obliges blocos to get corporate sponsors to pay off the massive licensing fees.

i think it could go farther, but i agree completely.  let carnaval be spontaneous, unpredictable, and radically playful!